Introdução

«RURAL MATTERS – Significados do Rural em Portugal: Entre as representações sociais, os consumos e as estratégias de desenvolvimento» é um projeto de investigação financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (referência FCT: PTDC/CS-GEO/117967/2010) e pelo FEDER (POFC/QREN) (referência COMPETE: FCOMP-01-0124-FEDER-019872).

As principais palavras-chave do projeto RURAL MATTERS são: Rural; Áreas rurais; Representações sociais; Procuras e consumos do rural; Estratégias de desenvolvimento rural.

Resumo do projeto

A intensificação, a partir de meados do século XX, dos processos de desruralização e de dissociação entre o rural e o agrícola constitui um dos traços mais marcantes das transformações das sociedades ocidentais. Tais processos podem ser vistos como causas e consequências das actuais reconfigurações do rural, representando constrangimentos e potencialidades. Particularmente em Portugal, o papel social e económico do rural alterou-se de forma dramática, passando de espaço entendido como produtor de alimentos e de reserva de mão-de-obra, para espaço cada vez mais reconhecido como multifuncional, combinando as produções agrícola e florestal com outras actividades e funções como a protecção ambiental, a conservação da paisagem, a preservação das tradições culturais e o desenvolvimento de actividades associadas ao turismo e ao recreio. As novas funções relacionam-se igualmente com uma redefinição do rural nas representações sociais e institucionais, motivadora de novos consumos e relações rural-urbano, assim como de rearranjos nas estratégias de desenvolvimento.

Este projecto tem como principal objectivo conhecer e compreender, a partir de perspectivas teóricas e metodológicas multidisciplinares, as articulações entre os significados do rural em Portugal e as procuras e consumos de que este é actualmente alvo, na expectativa de contribuir para o desenho e aplicação de estratégias de desenvolvimento mais eficazes. Com base em dados a recolher a partir de uma amostra representativa da população portuguesa, de diferentes documentos e fontes e ainda dos textos das políticas e medidas desenvolvidas nos últimos 25 anos, o projecto articulará a análise das diferentes representações sociais sobre o rural com o estudo das diversas procuras e consumos deste espaço, assim como com a análise das estratégias de desenvolvimento que a ele têm sido dirigidas. Mais concretamente, trata-se de conhecer os aspectos centrais na formação e no conteúdo daquelas representações, articulando-os com as principais representações, motivações e materializações dos consumos do rural e com o modo como as estratégias de desenvolvimento têm incorporado e veiculado as várias necessidades e vivências em presença nos territórios rurais.

Apesar do carácter generalizado das transformações ocorridas no mundo rural, as suas consequências são mais significativas nos países do sul da Europa, designadamente em Portugal, sobretudo devido à inadequação de uma boa parte dos seus sistemas produtivos face às novas exigências dos mercados globais. Um estudo de Oliveira Baptista et al. [1] demonstra o predomínio do rural frágil em Portugal, tanto pela ausência de dinâmicas sócio-económicas como pela fraca capacidade competitiva da agricultura. Este rural ocupa mais de 50% do território nacional e foi sendo desenhado no declínio de um tempo longo, como é patente nos trabalhos de Oliveira Baptista [2]; [3] e de Rolo [4]; [5]. No decurso desse tempo também as as representações e os significados sociais sobre a ruralidade se foram alterando. O rural que daqui emerge é sobretudo um rural entendido como pós-produtivo, que estando já depois da agricultura ainda não ultrapassou a longa identificação com aquela actividade. Por isso mesmo, enfrenta uma crise de identidade, cujos contornos e consequências se encontram amplamente por analisar.

É particularmente sobre o rural frágil que se têm concentrado novos olhares e novas exigências. Ainda que as especificidades históricas e culturais do país, assim como o lugar que a ruralidade foi ocupando no seu percurso político, económico e social, nos levem a colocar a hipótese da diversidade de representações e consumos do rural, parece-nos haver uma tendência crescente para a adopção de imagens e valores sociais globalizados e hegemónicos acerca do mesmo [6]; [7];[8];[9];[10]. Estas têm como elemento central a sua identificação com o autêntico, o natural e o idílico, aspectos que têm tido uma influência decisiva na redefinição dos contextos rurais e do seu futuro, que parece passar cada vez mais pela sua turistificação. Muitas destas imagens da ruralidade são veiculadas pelas indústrias culturais e pelo discurso político.

´Reconhecendo a diversidade que o mundo rural encerra, torna-se imperativo compreender a variedade de representações da sociedade portuguesa sobre o que é, o que pode e o que deve ser este território. Este imperativo não se relaciona apenas com o desenvolvimento dos espaços rurais, mas também com a coesão do território nacional e o valor da diversidade geográfica. Reconhecendo as actuais assimetrias do território português como um dado estrutural, será relevante assumir as oportunidades que o rural pode representar, encontrando novas dinâmicas e funções e procurando integrar diferentes (e muitas vezes conflituais) visões. Considerando que a sua compreensão integrada possui um carácter complexo e multidimensional, mobilizam-se e articulam-se, neste projecto, diversas perspectivas teóricas e metodológicas.

Referências:

[1] Oliveira Baptista, F. et al. (2003). Portugal Rural: Territórios e Dinâmicas. Lisbon: MADRP /GPPAA. http://artigosfct.wikispaces.com/file/view/Portugal_rural_apresentao.pdf  
[2] Oliveira Baptista, F. (1996). Declínio de um tempo longo. In Pais de Brito, J.; Oliveira Baptista, F. e Pereita, B. (coord.) O Voo do Arado. Lisbon: MNE, pp. 35 – 75.
[3] Oliveira Baptista, F. (2006). O Rural depois da Agricultura. In Fonseca, M. L. (coord.). Desenvolvimento e Território – Espaços Rurais Pós-agrícolas e os Novos Lugares de Turismo e Lazer. Lisboa: CEG, pp. 85-100.
[4] Rolo, J. C. (1996). Imagens de meio século da agricultura portuguesa. In Pais de Brito; J.; Oliveira Baptista, F. e Pereita, B. (coord.) O Voo do Arado,  Lisbon: MNE,  pp. 77-160.
[5] Rolo, J.C. (2003). Para uma Monografia dos Espaços do Rural: Informação sobre a Socioeconomia do Rural (e Concelhos) do Continente Portugês no Final do Sécul XX.ISA/INIAP/ANIMAR, Projecto Agro nº 62. Documento de Trabalho nº 4, Lisbon.
[6] Halfacree, K. (1993). Locality and Social Representation: Space, Discourse and Alternative Definitions of the Rural. Journal of Rural Studies, nº 9, pp. 1-15.
[7] Halfacree, K. (1995). Talking about Rurality: Social Representations of the Rural as Expressed by Residents of six English parishes. Journal of Rural Studies, nº 11, pp. 1-20
[8] Figueiredo, E. (2003a). Um Rural para Viver, Outro para Visitar – o Ambiente nas Estratégias de Desenvolvimento para as Áreas Rurais. PhD Thesis. Aveiro, University of Aveiro. (http://biblioteca.sinbad.ua.pt/teses/2009000062)
[9]      Figueiredo, E. (2008a). Imagine there’s no rural – the transformation of rural spaces into places of nature conservation in Portugal. European Urban and Regional Studies. Vol. 15, nº 2, pp. 159 – 171.
(http://artigosfct.wikispaces.com/file/view/imagine%20there%20is%20no%20rural.pdf)
[10] McCarthy, J. (2008). Rural geography: globalizing the countryside. Progress in Human Geography, Vol. 32, nº 1, pp. 129-137.